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Friday, September 17, 2004

Well now boy "Reach for the sky!" 

Steven Tyler, questionado certo dia acerca de Janis Joplin, apenas respondeu sucintamente que se não tiveres Janis Joplin as únicas raízes que terás serão as do cabelo. De facto, é uma máxima completamente verdadeira. Como é possível alguém fazer música, ou mesmo gostar de música, em toda a sua excelência, dr não tiver minimamente consciente das duas origens?
Não que seja necessário aprofundar até ao âmargo; Steven Tyler apenas recua a Janis Joplin para mencionar o rock, mas claro que antes dela muitos outros existiram. Não que isso a faça deixar de ser a referência musical que é (e que referência!), mas se tivermos presentes as raízes ainda anteriores, a música acaba por ter outro sabor.

Digam o que disserem, para mim a génese da música está nos campos de algodão dos Estados Unidos. Os blues foram os pais, uns pais com muitos filhos, alguns bastardos, mas todos do mesmo sangue: rock, soul, hip hop, punk, dance...
Por isto, ouvir estes artistas deixa-noos um gostinho especial na boca. Haverá algo mais puro do que ouvir Robert Johnson, Hank Williams ou Bo Didley?

Isto faz com que os blues despertem sensações desconhecidas na música. Canções cantadas ao ritmo de uma história, numa voz embriagada, não só literalmente, mas também de amor, mulheres e de uma certa saudade de casa.
Todos temos o nosso momento zen na música. Uns encontram-no mais dacilmente no jazz, outros na ópera. Eu encontro-o nos blues. Aquele momentos em que tudo parece fazer sentido, em que a música deixa de ser só música, transcende-se.
No entanto, o momento que vou referir não pertence a um Robert Johnson, um Howlin' Wolf, um Muddy Watters ou a um Willie Dixon. Podem pensar que é uma opinião facciosa, mas não o é. O meu momento zen é protagonizado pelos Rolling Stones.

Antes de serem a mairo banda de rock do mundo, os Stones dedicavam-se a interpretar os blues que aconteciam do outro lado do Atlântico, na pacata cidade londrina. Esta primeira impressão europeia dos blues conferiu-lhe novo significado.
A música em questão chama-se Cops And Robbers e foi escrita pelo mestre Bo Didley. Foi gravada pelos Stones, em 1964 no Camden Theatre de Londres, mas nunca conheceu edição oficial. Pode no entanto ser escutada no bootleg homónimo, de uma actuação televisiva, com um grande artwork. Nela, os Stones transcendem-se.
A letra, uma narração moral cantada magistralmente por Mick Jagger, assume contornos de conversa de café, copo de whisky numa mão, cigarro na outra. Um dos momentos vocais de Jagger, em que o sangue negro do Mississipi parece correr-lhe nas veias. Por outro lado, há a melódica harmónica do saudoso Brian Jones - haverá instrumento mais expressivo? - que acompanha a voz de Jagger, dando-lhe consistência, tempo e espaço. Depois há Charlie Watts a marcar o ritmo, sóbrio e natural, como o batimento cardíaco da canção. E só depois surgem Keith Richards e Bill Wyman, que complementavam aquele momento de perfeição. E quando estamos arrebatados por isto tudo, heis que Jagger irrompe com well now boy "Reach for the sky"!, sublime, como se os céus descessem à Terra por instantes.

O adjectivo só pode ser perfeito. Ouvimos vezes sem conta o vinil, até o prato do gira-discos estar cansado e cada vez nos soa melhor. E depois, toda a música que escutamos a seguir ganha outro significado. É que, e recorrendo mais uma vez a Steven Tyler, há músicas boas e músicas más, mas se mexerem contigo daquela maneira especial, então é uma dávida de Deus.


[Banda Sonora - Cops And Robbers; Cops And Robbers; 1964]


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