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Thursday, March 31, 2005

Desmistificar fantasmas 

Sublinho por baixo o que já aqui foi escrito uma vez, pela acutilante e pertinente mezzanine (com letra minúscula, tal como o d de dermot: os best of's são uma enfermidade pérfida da música, principalmente no panorama actual.
No entanto, sou ainda mais generalista, quando digo que as colectâneas, actualmente, só têm servido para degenerir o aspecto dos escaparates das discotecas do comércio tradicional (para não falar da parte dedicada às colectâneas do Top+).

O problema dos best of's e dos greates hit's é muito simples; geralmente, não passam de um sucedâneo de temas de sucesso de determinado artista. Antes ainda se limitavam a fazer best of's de bandas com extensos anos de carreira, ou de artistas já extintos (pelo menos para a música). Agora, qualquer one-hit-wonder tem direito a um best of, no final do primeiro ano de carreira, qual recompensa. Que o diga Britney Spears.
Um álbum é provido de substância e de unidade e não é preciso ser essencialmente conceptual para isto acontecer. É algo natural; qualquer tema deslocado do seu álbum de nascença, perde o significado que ganhou ao ser gravado e lançado naquele disco. Se num best of o único critério de selecção e de ordenamento é algo tão vago como a ordem cronológica, como é que podemos apreciar um best of como um álbum como os outros?
Por isso, na minha opinião, os best of's e os greatest hit's só servem como material de reconhecimento. Gostas de Shadows? perguntaram-me recentemente. Sim, foi a minha resposta instintiva. Mas uma rápida introspecção interior levou-me à conclusão que afinal não conhecia Shadows o suficiente para responder aquela pergunta de forma coerente, uma vez que o meu conhecimento acerca da banda se limitava ao Apache e a outros poucos temas que nem sabia o nome. A solução? Recorrer a um grestes hits duplo, pô-lo a correr no leitor de cds, e depois de ouvir os singles de maior saída da carreira extensa daqueles senhores, pude concluir que afinal a minha resposta intuitiva tinha sido acertada. E agora, no futuro, quando algum vinil dos Shadows se perfilar perante mim e se a ocasião o permitir, não o deixarei escapar.
Mas mesmo nesta condição, os best of's podem ser enganadores. Se um artista tiver uma carreira extensa, de altos e baixos, amadurecimentos, divagações estilísticas e outros afins, um best of acabrá por ser uma caldeirada em que o único fio condutor é a voz do intérprete. Por exemplo, os greastest hits de Elvis, o rei do rock n' roll, são na grande maioria colectânea de singles românticos para viúvas e solteiras, uma vez que foram os singles da sua fase de Las Vegas que obtiveram maior reconhecimento geral.
Por isso, utilize só os best of como reconhecimento do terreno e só em última ocasião.

Quanto às colectâneas, atravessam um período negro. Uma colectânea obedece a uma temática e esta, ou é mal escolhida, ou é mal feita, na maioria dos casos. Como a única preocupação é vender, e para isso é necessários atingir o mainstreem, as temáticas roçam tudo o que justificar a inclusão das bandas da moda (alguém falou dos Keane?).

No entanto, aparecem excepções que nos fazem suspirar de alívio. E uma excepção é a colectânea como a da Superfuzz. Não é o salvador do rock nem a bíblia do mesmo, mas é uma excelente escolha de temas rock do último ano, de um grupo de apreciadores que sabe o que quer (e sobretudo o que gosta). Desde o surf-rock, passando pelo garage-rock, o blues e o retro-rock, está tudo lá, dos menos conhecidos aos mais conhecidos.
Uma excelente audição para as tardes de Verão.

E já que estou numa de desmistificar pesadelos, apetece-me desmistifcar outro: o das bandas de covers.
Normalmente, uma banda de covers serve para animar uma festa ou uma boa noite de copofonia com os amigos. O seu valor musical é limitado ou pouco valorativo, uma vez que se limitam a tocar o que já está gravado ou a variar um pouco.
É indigno comprar um disco de uma banda de covers, certo?
Errado! Experimentem ouvir uma certa banda, que costuma passar as noites por entre os copos de whisky de um bar à beira de um cruzamento em Detroit. Chamam-se Detroit Cobras e tocam versões rock n' roll, tudo muito retro e moderno, com uma atitude muito cool.
Não tem nada a ver esta última dissertação, pois não?
Não faz mal, só me apetecia mesmo falar desta gente.


[Banda Sonora - Mumbo Jumbo; The Masonics; OST Superfuzz; 2005]

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Tuesday, March 29, 2005

Miss Flying Saucer 


Gretsch Corvette de 1964, partida e autografada. E minha.
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Sunday, March 27, 2005

Esqueçam a Páscoa. Nós temos os blues! 

Já aqui falei da Oficina do Cais, um antro musical de excepção, mas com uma qualidade acústica que deixa a desejar. O que nunca falei aqui foi dos Soledad Brothers. Por isso, para compensar esta falha, vou faze-lo num parágrafo inteiro.

Os Soledad Brothers são bons de mais. Fazer elogios assim é sempre relativo, mas as verdades são para ser ditas, cruas e directas, com muita honestidade. Como os blues. E se os Soledad Brothers são bons, temos que o dizer.
Este trio norte-americano de blues-rock escuros e negros, que começou a dar nas vistas para o mundo quando Jack White serviu de padrinho ao posar para a capa de um disco, passou pelo nosso país em digressão, primeiro no Porto e ontem no Montijo.

Soledad Brothers na Oficina Do Cais. Duas palavras que conjugavam na perfeição na mesma frase, como se os planetas se tivessem alinhado em sinal de boa sorte.
O concerto foi arrasador! É injusto tentar descrever por palavras um concerto destes, porque tudo o que escrever vai parecer redutor para tudo o que se passou lá. Como é que se descreve um baterista armado em Keith Moon e dois guitarristas, um com um autocolante na guitarra que dizia kick out the jam motherfuckers e outro a recorrer frequentemente aos riffs de Keith Richards, tudo acelarado umas trinta rotações. Naquele palco não estiveram só os Soledad Brothers: estiveram o rock demolidor dos The Who, os blues-rock-n'-roll dos Rolling Stones, o motim blues-rock dos MC5, o garage-rock dos The Cramps, a slide-guitar de Jeff Beck e até a harmónica de Bob Dylan! Naquele palco estiveram uma hora de blues suados e rock n' roll gritados!

Para os acompanhar numa música, subiu ao palco Dooley Wilson, o homem do blues que abriu as hostes com quarenta minutos de blues a uma pessoa. Esquecendo-se por momentos que era branco, Dooley Wilson deu uma aula de blues, deambulando pelas escolas de Robert Johnson, Johnnie Lee Hooker e Muddy Watters, concluindo o set com I Can't Be Satisfied. É verdade. Quarenta minutos foi pouco tempo para ficarmos satisfeitos. Mas a mestria com que a guitarra era tocada e como os blues seram regurgitados, fizeram pensar no que aconteceria se Dooley Wilson tivesse um pouco mais de instinto assassino!

A adrenalina suficiente para continuar a correr nas veias no dia seguinte.


[Banda Sonora - .32 Blues; Steal Your Soul And Dare Your Spirit; 2000]

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Friday, March 25, 2005

Os suspeitos do costume 

Nao é fácil falar de jazz, pelo menos para mim, por duas razões muito simples: primeiro, devido à especificidade do mesmo, que se multiplica num turbilhão de emõções e sentimentos particulares e que difere tanto entre músicos como a água difere do azeite. Falar sobre jazz é como dissertar sobre a nossa alma. E como raramente gosto de me expôr em público de tal maneira, falar sobre jazz é algo que não faço frequentemente.
Quanto à segunda razão que anunciei logo no início é porque conheço poucos interlocutores, cujo valor intelectual faça valer a pena uma abordagem a tal temática.

Gostar de jazz parece ser algo destinado apenas aos pseudo-intelectuais, na nossa sociedade. Ou pelo menos, assim me parece. Dizer que The Shappe Of Jazz To Come é um dos melhores álbuns de música, parece querer dizer que somos estranhos por gostar de um disco instrumental, de deambulações imprecisas, sem um pingo de letra que revele o que vai na alma do artista. Então e que tal, se em vez de o ouvirem, procurarem senti-lo?

Depois, há ainda outro caso em que o jazz parece ter-se tornado um lugar comum, onde se encontram as personalidades óbvias da área. Quem nunca teve numa tertúlia que resvalasse para uma discussão aerca de jazz e que temrinasse à volta duma fogueira ateada pelos nomes óbvios de Ornette Coleman, Duke Ellignton ou John Coltrane?
Claro que não vamos recusar um génio, apenas porque este caiu na rotina dos meandros da arte. Porque como disse alguém, um clássico será sempre um clássico, porque antes de o ser já era.
Então, mas... e os outros? Então e Jimmy Smith que um dia decidiu dar personalidade a um Hammond? Ou Gene Krupa que achou por bem tirar a bateria do anonimato? Ou mesmo Buddy Rich que lhe deu notoriedade? Ou Lucky Peterson? Ou o cosmopolita David Murray? Ou Ron Carter?

Por isso, apetece-me falar de alguém que é pouco falado. Ou pelo menos, não é falado da maneira correcta.
Mike Ladd é geralmente, associado ao hip-hop - raramente, o nome "Mike Ladd" e a palavra "hip-hop" não entram na mesma frase. No entanto, dizer simplesmente que Mike Ladd é um gajo do hip-hop, é o mesmo que dizer que a Stratocaster é só uma guitarra.
Mike Ladd é um gajo da música, com muita (des)semelhanças com Mike Patton. E o seu último álbum, Negrophilia, é um OSNI (Objecto Sonoro Não Identidicado) que passou quase despercebido pelos escaparates.
Nele, há uma fusão entre hip-hop, música electrónica e jazz - os ritmos do primeiro, os sons futuristas do segundo e a colaboração de vários avant-gardeistas do terceiro. Fantásticamente, Mike Ladd transforma tudo isto num caos organizado. Como se Mr. Spock e John Zorn tiveem ido beber um copo à galáxia Nebula, à velocidade do som na Enterprise.
Negrophilia não se ouve. Sente-se.


[Banda Sonora - Sam And Milli Dine Out; Negrophilia; 2005]

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Saturday, March 19, 2005

A nova meca da música da margem sul 

Hank Williams era um gajo do rock n' roll.
Gene Kupra era um gajo do rock n' roll.
Jimmy Smith era um gajo do rock n' roll.
O Maradona, o Hitler e o Pessoa eram gajos do rock n' roll.
D. Afonso Henriques foi o maior gajo do rock n' roll!
O rock n' roll existe há mais de um milhão de anos. Os Bunnyranch acreditam piamente nisto e não querem enganar ninguém. Para eles é só rock n' roll. E eles gostam. E nós também. E depois de os ouvirmos começamos a pensar que se calhar o D. Afonso Henriques era mesmo um gajo do rck n' roll.
Actualmente, são uma das bandas nacionais mais poderosas em palco. Naquele caldeirão de influências rock, Caló assume o protagonismo, puxando a bateria para a frente e tomando as rédeas daquela explosão de adrenalina, pólvora, blues, rockabilly, suor e êxtase. Ao seu lado há sempre o teclista Filipe Costa, que começa a tornar-se um caso sério na matéria.

Ontem à noite, apresentaram-se no palco da Oficina do Cais, no Montijo.
Até ao início deste ano, a sul do País, a oferta musical estagnava ao chegar a Lisboa. Da capital para baixo, apenas se voltava a ouvir qualquer coisa pelos lados do Algarve. No Barreiro tentava-se agitar algo, num circuito underground que, apesar dos esforços, lutava estoicamente contra os contratempos. Eis então que é inaugurado um novo espaço nocturno, no Montijo, numa antiga oficina de barcos.

A Oficina Do Cais é a nova meca da música da margem sul.
Em pouco tempo de vida, já passaram pelo seu interior vários nomes do principal panorama nacional da música: Wraygunn, Pluto, Dead Combo... E para a semana, preparam-se para receber os primeiros convidados internacionais - a visita dos norte-americanos Soledad Brothers, num concerto que promete muito.
No entanto, não é só a muita e boa variedade musical que o bar(?) oferece. Como se não bastasse, a Oficina do Cais é um espaço bastante agradável, que soube tirar proveito do forte carisma das antigas instalações. Com um ambiente muito retro, uma decoração fantástica, uma arquitectura interior acolhedora e música ambiente de qualidade, consegue disfarçar perfeitamente os problemas de acústica que sofre.

A Oficina Do Cais é uma casa do rock, de gajos do rock n' roll. E depois? É apenas isso. E nós gostamos.


[Banda Sonora - Voodoo Train;The Red, White And Black;2003]

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Wednesday, March 16, 2005

Mundos alienados 

Wes Anderson é um tipo com uma extrema falta de sorte nas traduções que fazem dos títulos dos seus filmes para português. Mas o que é isso comparado com a qualidade inequívoca dos seus trabalhos cinematográficos?
É claro que chateia imenso ir assistir a um filme que viu ser traduzido o título The Royal Tenenbaums para Uma Comédia Genial. Ainda para mais, Uma Comédia Genial é o título comum a qualquer filme de domingo à tarde, os quais evitamos tal como o Diabo evita a cruz.

Wes Anderson é um realizador que, em apenas três filmes, conseguiu deixar atrás de si um rasto cinematográfico inconfundível. Arrisca-se mesmo a ter, qualquer dia, o seu nome transformado em adjectivo, tal como teve Fellini. Ou seja, um dia, num futuro não distante, adjectivaremos de andersoniano, qualquer filme alienado, peculiar e invulgar que nos for colocado à frente dos olhos.
O cinema de autor de Wes Anderson é um universo próprio. Assistirmos a Rushmore, The Royal Tenenbaums ou The Life Aquatic With Steve Zisssou, são experiências completamente diferentes, uma vez que cada um deles é um universo destinto e independente. Cada filme é como um micro-universo dentro de um macro-universo, que é o próprio cinema. Ou então, é como uma realidade paralela alterativa, onde tudo é a face oposta do espelho da realidade em que vivemos.

Alice não atravessou o espelho para ir ter áquele País das Maravilhas; bastou-lhe meter uns ácidos para alucinar com Raínhas de Copas, coelhos atrasados ou lagartas a fumar cachimbo em cima de cogumelos. John Lennon e Paul McCartney também não se inspiraram num qualquer desenho infantil para comporem Lucy In The Sky With Diamons; bastou alguma noite encharcada em LSD para criar uma cantilena psicadélica em caleidoscópio. Por isso, não se pense que Wes Anderson passa horas e dias inteiros em frente a uma folha de papel em branco, virando e revirando ideias, para criar os seus universos cinematográficos; deve-lhe bastar uma boa noite de cavaqueira com os amigos, num qualquer bar local, bem regado a cerveja (ou a whisky, uma vez que as celebridades só bebem bebidas caras).

The Life Aquatic With Steve Zissou é o seu mais recente filme, que estreia entre nós este mês, com o infeliz título de Um Peixe Fora De Água. Neste micro-universo há um Jacques Cousteau com nome de jogador galáctico de futebol, que afinal não é mais que Ishmael. No entanto, o caso mais peculiar desta realidade alternativa é um rapaz negro que por lá circula, também com nome de estrela de futebol, que quando se senta com a sua viola, começa a dedilhar versões acústicas de músicas de David Bowie cantadas em português.
Haverá algo mais estranho que isto? A partir daqui, tudo o que Wes Anderson criar já não causará espanto.

Esse rapaz responde pelo nome de Seu Jorge. É brasileiro e é actor, que começou a circular pelas bocas do mundo com a participação no genial A Cidade De Deus, sob o nome de Mané Galinha. No entanto, o que poucos sabem é que Seu Jorge tambem é cantor, compositor e músico, e editou no ano transacto um dos mais interessantes discos de 2004 - Cru.

Em Cru, o seu segundo álbum, ouvimos um universo deveras peculiar, tal como acontece ao assistirmos a um filme de Wes Anderson. Cru é o espelho do seu criador: da sua admiração pela pandeireta do samba de Zeca Pagodinho, da sua admiração pelo tropicalismo de Caetano Veloso, da sua admiração pelo multifacetismo de Tom Zé, da sua admiração pelo piano funk de Stevie Wonder, pela sua admiração pelo transformismo de David Bowie e da sua admiração por Romário(?). Em Cru ouvimos samba francês, flamengo brasileiro ou outras alienações do género.
Não é a quinta dimensão. Mas é uma dimensão alternativa de boa e imperdível música.


[Banda Sonora - Chatterton; Cru; 2004]

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Friday, March 11, 2005

Lendas do rock n' roll (II) 

O ano era o de 1967 e estava-se em pleno flower power - paz e amor, hyppies, liberação sexual, legalização das drogas, espiritualidade e muito pdicadelismo, vulgo LSD. No campo musical, procedia-se também a uma revolução de mentalidade e atitude, ou não fosse a música o melhor espelho dessa condição social. E eis que surge o Festival Internacional Pop de Monterey.

Monterey não foi só um festival hyppie - foi um marco dos anos 60. Dois anos antes de Woodstock, o expoente máximo do flower power e da cultura hyppie, o festival de Monterey foi três dias de únicas e espantosas experiências, visuais e auditivas. Rezam as histórias que milhares de pessoas se juntaram numa comunhão perfeita com a polícia, que carregava flores em vez de armas; a relva tornou-se cor-de-laranja e o céu verde, e de 16 a 18 de Junho desse mesmo ano, o Mundo rodou numa só voz, embalado numa onda de paz e amor. E foi nesse festical que, como a fénix, a música se sacrificou, imolada, e renasceu das próprias cinzas!

A maioria dos artistas actuou de graça, apenas com as despesas de deslocação e estadia pagas. Tal como os festivaleiros, também para eles foram três dias de reunião e descoberta. Do alinhamento brotavam nomes como o da ainda então desconhecida estrela soul Otis Redding, a anti-diva rock Janis Joplin, os psicadélicos Grateful Dead, o oriental Ravi Shankar, ou as duas estrelas principais desta história - os The Who e os The Jimi Hendrix Experience. E por entre a multidão, reconheciam-se os rostos de sua majestade Brian Jones ou da subterrânea Nico. Tudo isto ficou testemunhado pela voz incomparável de Eric Burdon, vocalista dos The Animals, que num verso fantástico de inspiração criativa sublime, conseguiu consolidar todo o espírito daquele momento de três dias em singelas palavras: Young gods smiled upon the crowd/Their music being born of love/Children danced night and day/Religion was being born/Down in Monterey.

A lenda conta que um quarteto de Londres, baptizado de The Who, se insurgiu contra um trio liderado por um norte-americano chamado Jimi Hendrix, cuja presença tinha sido recomendada (imposta?) por Paul McCartney, pelo facto de estes irem fechar o certame. O trio que compunha aquela experiência musical única não se resignou, uma vez que também mantinham relacionamento estreito com o orgulho e a ambição e as relações azedaram entre os músicos. Como não se chegou a uma resolução pacífica, a organização teve que intervir e decidiu manter tudo como estava - os The Who tocariam primeiro que The Jimi Hendrix Experience, que seriam os últimos cabeças-de-cartaz a actuar.

Os The Who subiram ao palco para fazer aquilo que sabiam fazer melhor - actuar! Não era só a poderosa voz de Roger Daltrey, mas principalmente o esvoaçante Pete Towshend e o furacão Keith Moon, que faziam aquela tempestade em palco, a que o baixista John Entwhistle se juntava para se chamarem The Who. E se por si só já eram uma força da natureza desvastadora, o que seriam se subissem ao palco com dois outros poderos indivíduos - vingança e orgulho.
O resultado foi avalassador. Contam as crónicas que a banda em 45 minutos fez uma das mais estrondosas actuações, culminadas com a habitual destruição do palco, encharcados em suor, sangue e lágrimas.
Isto já não contam as crónicas, mas ao imaginarmos este retrato (ou depois de vermos os registos video existentes), facilmente podemos visualizar Pete Towshend a abandonar o palco, a cruzar-se com Jimi Hendrix e a dizer-lhe Agora faz melhor!

Jimi Hendrix subiu ao palco, apresentou o seu baterista Mitch Mitchell e o seu baixista Noel Redding e fez melhor. Muito melhor! Tocou e encantou como só ele sabia fazer - tomando a sua guitarra nos braços, qual amante devassa em noite selvagem, fazendo-a vibrar como Little Richards fazia vibrar a sua voz ou fanzendo-a gritar como Keith Moon fizera gritar a sua bateria. E por fim, fez o inacreditável.
Jimi Hendrix dirigiu-se ao público e anunciou que iria sacrificar o seu maior amor - a guitarra. Colocou-a no chão, regou-a de gasolina, rock, blues, jazz e a sua própria inspiração e pegou-lhe fogo. Por momentos, fez-se magia no ar, por aquele momento espontâneo e natural. E quando o fumo assentou, não foi só Jimi Hendrix que se ergueu - foi um novo mundo, uma nova ordem musical que acabara de revolucionar.
E a música nunca mais foi a mesma.



Guitarras destruídas acabam por ser um resultado natural de quem faz amor com o palco. Nisto, Paulo Furtado tem-se tornado um verdadeiro ninfomaníaco.
Contam as lendas que em 1999 (ou terá sido em 98), os Wraygunn se apresentaram no Comix, um bar no Porto, para darem um concerto inesquecível. Essa noite acabaria por fazer uma vítima - uma Gretsch Corvette de 1964.

As lendas deixaram de o ser! Numa acção conjunta entre o Miau.pt e a INDE, a favor das vítimas do tsunami asiático, foram colocados em leilão vários objectos cedidos por alguns artistas do panorama musical português. E de entre o espólio encontram-se os restos mortais da dita guitarra, apenas mencionada por lendas e histórias perdidas.
Uma boa oportunidade para se ter um pouco de história em casa.


[Banda Sonora - A Quick One While She's Away; Monterey Box Set; 1997]

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Saturday, March 05, 2005

Odeio dizer bem te avisei 

O revivalismo rock entrou-nos porta dentro, à boleia dos Strokes, já o estamos cansados de saber.
E aproveitando a nova onda, a MTV rapidamente preencheu a sua grelha de programção com tudo o que tivesse uma guitarra e uma bateria no mínimo, rotulando-os automaticamente como "a nova sensação rock". O público mais jovem e ingénuo de ouvido pasmou com todo aquele fascínio garage rock, tal como o Homem pasmou a primeira vez que viu a roda. Entretanto, já gente como os Gories ou os Cramps faziam há décadas, aquilo a que agora catalogavam como novo.

Aproveitando a euforia, a MTV decidiu gladiar duas dessas apelidadas "novas sensações rock", num qualquer MTV Music Awards, qual Coliseu de Roma. Apresentando no canto esquerdo, os The Vines, uma fusão Beatles meets Nirvana, com mais dos primeiros do que dos segundos. Claro que a MTV aproveitou logo o single furioso mas de plástico, de guitarras em riste e vocalização esquizofrénica, condizente com uma adolescência sem nada com que se revoltar, mas revoltada com tudo - Get Free. No canto direito, os The Hives, banda sueca com verdadeira escola garage rock, vestidos a preto e branco e com um demónio gritante atrás do microfone. As semelhanças entre as duas, quedava-se quiçá, pelo nome...
Injusta ou não, o que é certo é que os Hives deram uma tareia descomunal a uns Vines que, em total desespero, destruíram o palco, tentando que a comum comparação com o colectivo de Kurt Cobain justificasse a atitude. Do outro lado, um sereno conjunto de engravatados a branco e preto tinha ainda o desplante de dizer Sabemos que vocês querem que toquemos mais. Mas não nos deixam!

Neste tsunami de revivalismo rock que nos invadiu, os Hives foram a esécie que melhor representa o garage rock. Têm a atitude nórdica rock n' roll; têm bolas de energia, curtas e directas, a que chamam de canções; têm nomes adoptivos, tudo muito cool; e têm estilo. Muito estilo. Não são só os uniformes bi-colores, mas principalmente o vocalista, Howlin' Pelle Almqvist. Este demónio gritante é um Mick Jagger jovem, com a rebeldia e o freakout de Johnny Rotten - uma força da Natureza que enche o palco, canta (grita), pula, dança, cativa e seduz. Literalmente, faz amor com o palco!

Agora surge o cerne da questão: e isto chega? E a música?
Os The Hives têm a escola e não se preocupam se cantam sobre o estado da nação ou o estado do bar da esquina. Mas quem é que quer saber o que diz Howlin' Pelle Almqvist quando este debita aquelas bolas de fogo? No entanto, falta ali qualquer coisa à música. Fossem todas como os singles Main Offender ou Hate To Say I Told You So e não se colocava esta pergunta. No entanto, não são.
Um concerto até pode ser apenas música, mas havendo uma componete visual bem explorada, passa-se para outro nível - o da glorificação/galvanização. Os The Hives começam pelo fim, ou seja, começam pela galvanização e só depois vem a música. Se resulta? Resulta, quando são cargas curtas de choque, porque se este se estende um pouco mais, começa a entrar em rotina. São assim os álbuns, que cansam de ouvir quando deviam era cansar de saltar. O garage rock é atitude, mas não é só riffs e gritos, o mais alto possíve. Há mais qualquer coisa. O quê? É o que eles têm de procurar, não chega de viver da imagem e da atitude ao vivo.

É certo que não foram eles que inventaram a roda. Também é certo que eles sabem pô-la a rodar. Mas convém saber porque roda ela.


[Banda Sonora - Hate To Say I Told You So; Veni Vidi Vicious; 2000]

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Tuesday, March 01, 2005

O concerto mais esperado do ano 

Não, não é o dos Soledad Brothers (porque o ano mal começou). E sim, há ironia impregnada no título.
Posto esta última consideração, posso afirmar que sim, o título é mesmo relacionado com o concerto dos U2, no estádio de Alvalade, em Outubro próximo.

Sinceramente, e por mais que tente, não consigo entender esta febre que circunda o evento.
Os U2 são inequívocamente uma boa banda, de créditos firmados. É certo que já tiveram melhores momentos, principalmente por alturas dos épicos Rattle And Hum ou Joshua Tree; nesta tentativa de regresso aos velhos tempos, depois da modernização encetada por Achtung Baby, All That You Can't Leave Behind é um disco razoável e How To Dismantle An Atomic Bomb é um álbum medíocre. Ambos os discos, curiosamente, têm títulos ridiculamente extensos. É carreira suficiente para marcar posição, mas nãó é motivo suficiente para uma febre destas, que fazem ser montados gigantescos acampamentos à porta das bilheteiras.
Digo isto porque não é a primeira vez que eles vêm ao nosso país (ao contrário do que acontecia com a raínha da pop, Madonna, o ano passado), nem a segunda, nem a terceira - por isso não se pode falar em novidade. Os U2 também não são os Rolling Stones, nem esta passagem tão pouco representa uma possível última digressão, como a última dos Stones, que parou em Coimbra, em 2003. Então porquê este aparato?

Todos sabemos que o povo português gosta destas festas, que ainda por cima os possibilita montar arraiais destes. Foi assim com a Madonna e com os Stones, nos anos transactos e é agora com os U2. No entanto, não compreendo o porquê de tamanho fascínio, superior ao que se observou com o à volta da Madonna ou dos Stones. E se a Madonna tinha bilhetes a 50€ e os Stones a 40€, porque têm os U2 bilhetes a 60€?
E depois vemos o Bono, ao lado de Tony Blair e de George W. Bush, em gigantescas cimeiras internacionais contra a pobreza, ao mesmo tempo que pede a um desgraçado dum português, cem contos para ir vê-lo cantar.

É certo que já não há mega-concertos como havia antigamente e os U2 são um dos últimos representantes. Os Stones também o são e num estádio em que as obrigatoriedades logísticas eram certamente mais caras, cobraram muito menos nas entradas. Porquê então 60€ pelo bilhete mais barato?

O problema passa então pela massificação de espaço de antena que os media nacionais dedicam ao certame. É merecido, é certo, mas é demais e exagerado. E depois assistem-se a cenas lamentáveis como as da TVI, que hoje tentava já transformar a corrida aos bilhetes em caso de polícia, uma vez que uma das três bombas que vendiam bilhetes no Porto, tinha um menor número de entradas que as outras duas.
E é triste verificar que das muitas destas pessoas que acampam estoicamente à porta das bilheteiras, como se fosse uma tarefa hercúlea da qual todos nos temos que orgulhar, uma grande parte delas é para se dedicar à candonga e a outra grande falange é gente que só vai a um concerto por ano e que pensa que os U2 começaram em 2000 e que não fazem ideia do que é o Unforgattable Fire.
Aos do primeiro grupo, apenas tenho a desejar que, tal como por alturas da Madonna e dos Stones, fiquem com os bilhetes encalhados e o dinheiro empatado.

Quanto ao concerto, certamente não irei ver nestas condições. Ficarei a assistir pela televisão a este movimento enorme de público, como se Portugal fosse um país em que as movimentações maciças de gente por motivos culturais fossem uma realidade, não invejando os que lá vão estar.
E o Bono bem podia vir tocar ao meu quarto que eu já não o queria ouvir. E mesmo se ele me oferecer bilhetes para o concerto, eu vou ver os Keane (vómito) e a outra banda qualquer que vai dividir a abertura e depois venho-me embora. Só para ele ficar lixado comigo.

PS- As audições próximas de lançamentos para breve remetem-se em dois álbuns que projectam boas indicações: Lullabyes To Paralyze e Devil's Playground. Vamos a ver...


[Banda Sonora - Gloria; Horses; 1975]

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