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Friday, March 11, 2005

Lendas do rock n' roll (II) 

O ano era o de 1967 e estava-se em pleno flower power - paz e amor, hyppies, liberação sexual, legalização das drogas, espiritualidade e muito pdicadelismo, vulgo LSD. No campo musical, procedia-se também a uma revolução de mentalidade e atitude, ou não fosse a música o melhor espelho dessa condição social. E eis que surge o Festival Internacional Pop de Monterey.

Monterey não foi só um festival hyppie - foi um marco dos anos 60. Dois anos antes de Woodstock, o expoente máximo do flower power e da cultura hyppie, o festival de Monterey foi três dias de únicas e espantosas experiências, visuais e auditivas. Rezam as histórias que milhares de pessoas se juntaram numa comunhão perfeita com a polícia, que carregava flores em vez de armas; a relva tornou-se cor-de-laranja e o céu verde, e de 16 a 18 de Junho desse mesmo ano, o Mundo rodou numa só voz, embalado numa onda de paz e amor. E foi nesse festical que, como a fénix, a música se sacrificou, imolada, e renasceu das próprias cinzas!

A maioria dos artistas actuou de graça, apenas com as despesas de deslocação e estadia pagas. Tal como os festivaleiros, também para eles foram três dias de reunião e descoberta. Do alinhamento brotavam nomes como o da ainda então desconhecida estrela soul Otis Redding, a anti-diva rock Janis Joplin, os psicadélicos Grateful Dead, o oriental Ravi Shankar, ou as duas estrelas principais desta história - os The Who e os The Jimi Hendrix Experience. E por entre a multidão, reconheciam-se os rostos de sua majestade Brian Jones ou da subterrânea Nico. Tudo isto ficou testemunhado pela voz incomparável de Eric Burdon, vocalista dos The Animals, que num verso fantástico de inspiração criativa sublime, conseguiu consolidar todo o espírito daquele momento de três dias em singelas palavras: Young gods smiled upon the crowd/Their music being born of love/Children danced night and day/Religion was being born/Down in Monterey.

A lenda conta que um quarteto de Londres, baptizado de The Who, se insurgiu contra um trio liderado por um norte-americano chamado Jimi Hendrix, cuja presença tinha sido recomendada (imposta?) por Paul McCartney, pelo facto de estes irem fechar o certame. O trio que compunha aquela experiência musical única não se resignou, uma vez que também mantinham relacionamento estreito com o orgulho e a ambição e as relações azedaram entre os músicos. Como não se chegou a uma resolução pacífica, a organização teve que intervir e decidiu manter tudo como estava - os The Who tocariam primeiro que The Jimi Hendrix Experience, que seriam os últimos cabeças-de-cartaz a actuar.

Os The Who subiram ao palco para fazer aquilo que sabiam fazer melhor - actuar! Não era só a poderosa voz de Roger Daltrey, mas principalmente o esvoaçante Pete Towshend e o furacão Keith Moon, que faziam aquela tempestade em palco, a que o baixista John Entwhistle se juntava para se chamarem The Who. E se por si só já eram uma força da natureza desvastadora, o que seriam se subissem ao palco com dois outros poderos indivíduos - vingança e orgulho.
O resultado foi avalassador. Contam as crónicas que a banda em 45 minutos fez uma das mais estrondosas actuações, culminadas com a habitual destruição do palco, encharcados em suor, sangue e lágrimas.
Isto já não contam as crónicas, mas ao imaginarmos este retrato (ou depois de vermos os registos video existentes), facilmente podemos visualizar Pete Towshend a abandonar o palco, a cruzar-se com Jimi Hendrix e a dizer-lhe Agora faz melhor!

Jimi Hendrix subiu ao palco, apresentou o seu baterista Mitch Mitchell e o seu baixista Noel Redding e fez melhor. Muito melhor! Tocou e encantou como só ele sabia fazer - tomando a sua guitarra nos braços, qual amante devassa em noite selvagem, fazendo-a vibrar como Little Richards fazia vibrar a sua voz ou fanzendo-a gritar como Keith Moon fizera gritar a sua bateria. E por fim, fez o inacreditável.
Jimi Hendrix dirigiu-se ao público e anunciou que iria sacrificar o seu maior amor - a guitarra. Colocou-a no chão, regou-a de gasolina, rock, blues, jazz e a sua própria inspiração e pegou-lhe fogo. Por momentos, fez-se magia no ar, por aquele momento espontâneo e natural. E quando o fumo assentou, não foi só Jimi Hendrix que se ergueu - foi um novo mundo, uma nova ordem musical que acabara de revolucionar.
E a música nunca mais foi a mesma.



Guitarras destruídas acabam por ser um resultado natural de quem faz amor com o palco. Nisto, Paulo Furtado tem-se tornado um verdadeiro ninfomaníaco.
Contam as lendas que em 1999 (ou terá sido em 98), os Wraygunn se apresentaram no Comix, um bar no Porto, para darem um concerto inesquecível. Essa noite acabaria por fazer uma vítima - uma Gretsch Corvette de 1964.

As lendas deixaram de o ser! Numa acção conjunta entre o Miau.pt e a INDE, a favor das vítimas do tsunami asiático, foram colocados em leilão vários objectos cedidos por alguns artistas do panorama musical português. E de entre o espólio encontram-se os restos mortais da dita guitarra, apenas mencionada por lendas e histórias perdidas.
Uma boa oportunidade para se ter um pouco de história em casa.


[Banda Sonora - A Quick One While She's Away; Monterey Box Set; 1997]

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