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Saturday, January 08, 2005

O Rei faz anos 

Se fosse vivo, Elvis Presley completaria hoje 70 anos.

Artista ímpar, cantor incomparável, ícone de uma geração, marca intemporal, influenciador, agitador e inovador. Elvis foi tudo isto e mais ainda. Mas para alguns, uma curta minoria, continua a ser um plagiador, um usurpador, um imitador e um excelente interpretador de canções alheias.
Seja qual for a convicção, o que é certo é que Elvis Presley foi um artista como poucos houveram até hoje, que vincou a música por uma certa zona, alterando-a e modificando-a para o rumo que tomou até hoje. Dono de uma voz inconfundível e vibrante, era principalmente, um animal de palco, uma máscara de carisma em que bastava apenas um gemido para pôr uma multidão em delírio. Uma voz talvez só comparável com a de Johnny Cash, tais eram os seus efeitos. E que será sempre recordado como o Rei. O Rei do rock n' roll. E o rei da música como a conhecemos hoje.

É certo também que a carreira de Elvis foi pulvilhada de incongruências; uma carreira cheia de altos e baixos, que não atingiu voos mais elevados devido aos rumos errantes que escolheu; uma carreira cheia de escolhas erradas, que só pode servir de mau exemplo para qualquer artista que procure um futuro minimamente proveitoso. Mesmo assim, chegou para alcançar o topo e ser coroado rei. Talvez isso queira dizer alguma coisa.

Não há dúvidas que Elvis Presley não inventou o rock. Este já existia e já antes dele, havia quem o cantasse. A maioria das grandes canções que deram projecção a Elvis não eram mais do que versões de outros artistas, na maioria negros, que apenas alteravam a velocidade. No entanto, era impensável para a altura, um negro alcançar a popularidade que poderia ter alcançado. O que não impediu que gente como Little Richard seja hoje vista como um dos pais do rock.
No entanto, Elvis teve o condão, não só de dar projecção ao rock n' roll, mas de o tornar acessível a todos. O rock n' roll era sinónimo de ritmo, de dança e de corpos a mexer; e corpos a mexer eram sinónimo de promiscuidade. Não era assim de estranhar que o rock n' roll fosse tomado como a música do Diabo. Elvis assumiu assim, sem problemas, a face do Diabo, o que lhe permitiu ser odiado por muita gente. Mas em compensação, era amado por muitas mais. E a sua abordagem ao rock n' roll foi única. Elvis não é só o Rei por ter tocado rock n' roll primeiro que os outros brancos; é o Rei pela maneira que o cantou. Com luxúria, malícia, sensualidade... Com o próprio rock n' roll na alma.

No entanto, Elvis não se contentava com o que tinha - e ele tinha tudo. Queria o cinema! E apesar do seu estatuto lhe ter permitido alcançar a sétima arte, o que é certo é que o seu talento representativo não se igualava minimamente ao musical.
O seu registo cinematográfico quedou-se por uma mão cheia de filmes que variavam entre o medíocre e o razoável, acabando por tomar sempre o papel de si próprio, ou seja, de estrela musical, em que as produtoras aproveitavam para fazer mais alguns trocos com a figura do Rei a cantar mais algumas cantilenas.
O cinema trouxe a desilusão a Elvis. Mas trouxe também a saturação pela música. E foi este o seu primeiro erro. Mas que mesmo assim teve o condão de ser a génese de algo que hoje tomamos como normal - o teledisco.
No entanto, era o princípio do fim.

Compreensivelmente, a música já não lhe dizia nada. E Elvis alistou-se na tropa. O governo esfregou as mãos de contente e não tentou salvaguardar o seu maior ícone: ter o maior ícone juvenil e não só alistado de livre vontade no exército, era a maior campanha de propaganda que não imaginariam nem nos melhores sonhos.
Os fãs temeram o pior. E o pior aconteceu, mas não como esperariam. É verdade que Elvis regressou são e salvo, mas voltara piegas e romântico. Estava apaixonado, era o amor, dirão uns. Seja o que for, Elvis atraiçoara a própria música. Tinha perdido a rebeldia, o inconformismo, o carisma... Tinha perdido o rock n' roll.
Os fãs torceram o nariz às várias tentativas de regresso e Elvis também não soube escolher o melhor caminho. As suas tentativas foram na maior parte das vezes fugas para a frente. E aproveitando o seu carisma sexual e a sua voz fenomenal, acabou por esgotar os últimos cartuchos inflando tudo o que a sua carreira anterior tinha possibilitado, terminando musicalmente nos espectáculos tristes de Las Vegas.

Quem diria que o jovem rebelde que cantava o amor, a liberdade, o sexo e a velocidade, ia ser o mesmo homem, pejado de lantejoulas, que se arrastava pelos palcos no recreio da América, destroçando corações de viúvas e românticas complexadas, depois de ter tido meio mundo feminino aos pés? Daí preferirem acreditar que aquele não era o verdadeiro Elvis. Que o verdadeiro tinha fugido para o refúgio de uma ilha deserta algures no Pacífico. E que ainda hoje continua vivo. Porque é melhor matar um ídolo na melhor altura em que o vimos, para termos dele a melhor das recordações, do que acompanhar a sua decadência.

Elvis deixaria ainda mais meia dúzia de boas canções, mas longe da genialidade dos seus tempos de rockstar. Como legado, tinha deixado a importante figura da estrela rock e do próprio rock.
Conta a sua mulher, que ao verem um concerto de Rod Stewart, Elvis exclamou assustado, ao ver o ex-vocalista dos Faces a entrar em palco vestido de lantejoulas e maquilhado, "Meu Deus, o que eu criei". Elvis criou o rock n' roll! Mas o bebé cresceu descontrolado e tornou-se num monstro generoso. Elvis viveu alheio ao crescimento do seu filho, seguindo um rumo separado. Quando tentou a reconciliação, o seu rebento rejeitou-o. E Elvis não o entendeu. Será sempre, no entanto, o pai do rock n' roll. E mais importante que isso, será o Rei.

PS- A ampola volta a fazer pop


[Banda Sonora - Blue Suede Shoes; Elvis Presley; 1956 ]


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